11.9.07

"ora, direis, ouvir estrelas..."


Eles são os maiores heróis do universo DC e nesse tempo não faziam lavagem cerebral uns nos outros. Dando início aos trabalhos hermenêuticos deste blog, temos aqui um momento épico da era de prata: The Brave and The Bold, volume I, n. 28, de 1960, ou para os iniciados, a primeira aventura publicada da Liga da Justiça da América, também conhecida pelo vulgo como "Superamigos". Um importante momento da história dos super-tipos almofadinhas da DC, antes deles tentarem imitar os meliantes da Marvel. O serviço é assinado por Gardner Fox no roteiro e Mike Sekowsky na arte, segundo dá notícia a edição Arquivo DC: Liga da Justiça da América, da pannini, da qual vamos fazer uso aqui.

A arte de Sekowsky é agradável, limpa e dinâmica, bem como é o forte da era de prata. Além disso, é bom ver a Mulher Maravilha no que hoje seria um sóbrio e elegante shortinho, ao invés dos biquinis de hoje em dia (a reedição da peça neste teor foi uma das poucas coisas que salvou o DK2 de Frank Miller). Já o enredo de Gardner Fox, bem, estamos na era de prata, então, entremos no espírito...

Bem, que grande inimigo poderia motivar a reunião dos maiores heróis da terra? Darkseid? O Antimonitor? O Monarca? A esposa carente de atenção de Ray Palmer? Nada tão sofisticado, o primeiro adversário documentado da Liga da Justiça é uma estrela-do-mar que vem do espaço, aparentemente ultra-evoluída e com planos de conquistar nosso planeta. Se eu fosse uma estrela do mar, não me importaria com o planeta ou com a humanidade, me contentaria com o mar. Onde será que Gardner Fox teve uma idéia dessas? O cara está lá pegando um sol na praia e pensa, "super-heróis deviam lutar com estrelas-do-mar..."

E se o assunto é mar, nossa história começa com ele, o monarca dos oceanos e amigo dos peixes:



Peter, o Baiacu.

De novo, de novo:

Peter, o Baiacu.

Soa bem, não? Assim ficamos sabendo que as criaturas do mar, amigas do Aquaman, vivem num clima descontraído e amistoso, tratando-se umas às outras por alcunhas carinhosas como "Peter Baiacu", nome que ficaria bem num surfista marolinha ou no peixinho de borracha que sua mãe deixava você levar pra banheira. Fato é que o tal Peter honra sua condição de olheiro e dá todo o serviço:


Vida inteligente? Lamento, Starro, planeta errado. Porque não tenta Daxam? Parece que lá o povo é tão sabido que todo mundo vira médico.

Depois, Peter, que história é essa de ficar de cabeça pra baixo? Você faz meditação transcendental ou algo assim? Ha, nada mais do que ocasião para o primeiro momento educativo da nossa história:

Quem precisa da Enciclopédia Britannica tendo um gibi pra ler?

Qualquer sorte, Starro toma gosto e resolve ficar por aqui mesmo, ao descobrir que tem parentes no local:

Imagine a reviravolta na vida de três estrelinhas-do-mar mequetrefes rastejando nas profundezas e sem nenhuma perspectiva de vida, subitamente alçadas ao patamas de criaturas cósmicas por um primo distante e desconhecido! São estas peripécias dramáticas que fazem um épico literário!

Ciente da ameaça, nosso herói faz aquilo que todo o membro da Liga da Justiça aprendeu a fazer ao se inteirar de uma ameaça global: convoca uma reunião!



Novo momento educativo do gibi, afinal de contas, aquele selinho do código de ética no canto da capa tem seu preço. Consta do Aurélio:

equinodermos. S. m. pl. Zool. Animais enterozoários, com simetria radial superposta à bilateral, formada por um eixo longitudinal da boca à extremidade distal. São do ramo Echinodermata; têm o corpo revestido de placas calcárias, formando um esqueleto de espinhos externos; sistema vascular aqüifero, e tubos externos em forma de pés para locomoção.

Mas falávamos de reunião. Qualquer leitor habitual da Liga da Justiça conhece isto. Estes caras adoram uma reunião, e acho que é por isso que o macarthismo suspeitou que fossem comunistas. "Oi, Batman, é o Aquaman! Você tá aí? ... Não está mesmo? ... Bom, então, era só pra te avisar que estou marcando uma reunião pra discutirmos a invasão alienígena da semana e a reforma da sede. Vê se não falta, ok?"

A utilidade destas reuniões, um super-herói da Image poderia pensar, é bem duvidosa. Deve ser por isso que Superman e Batman faltam nesta. Sobre isso, é interessante comparar o nível de interesse de alguns membros.


"Ora", deve pensar o último filho de Kripton, "não tenho tempo pra votar outra monção de protesto contra a EC Comics! Estou ocupado salvando o mundo!" Mas é curioso o super, uma vez que já estava ali pelo espaço, não ter reparado no Starro chegando na Terra. Ou reparou? "Que interessante, uma estrela-do-mar gigante vem vindo do espaço, mas não tenho tempo pra isso, tenho que cuidar destes meteoros!"


Caramba, haja meteoro pra manter ocupado um cara com superforça e supervelocidade. Isso tá me cheirando a preguiça mesmo, como se o super soubesse que geralmente estas reuniões não dão em nada. Enquanto isso em Gotham City:


Batman sempre tem isso. Ligam pra ele, "Batman, Darkseid está invadindo a Terra!", ele responde, "Dane-se, minha prioridade é Gotham City, primeiro vou prender este cara que estacionou em lugar proibido, depois ajudo vocês com este ditador intergaláctico sanguinário e ultra-poderoso!" É um cara dedicado a sua comunidade, temos que admirar.

E vejam vocês, enquanto os dois maiores ícones da DC fazem corpo mole, é o Flash que mostra serviço e usa a cabeça pra dar conta de seus afazeres e não faltar à reunião:


Bravo, Flash! Assim é que se faz! Que homem de aço que nada! Maior detetive do mundo uma pitomba! Isso sim, que é super-herói, evita a ameaça e ainda ensina ao leitor o que é um tornado, garantindo o terceiro momento educativo da nossa história!

Vale a pena observarmos ainda um último membro da liga receber o chamado:




Só pode ser um babaca esse Steve Trevor. Tá na cara que essa mulher não quer nada com ele! Que mulher em 1960 recusaria um pedido de casamento de um piloto da Força Aérea Americana? Depois, uma reunião que habitualmente não deve nem ser tão importante, a ponto dos dois mais importantes heróis da terra não verem qualquer urgência em comparecer, serve como desculpa pra ela dar um perdido no cara. Das duas, uma, Steve: ou ela está dando pra um cara desse aí dessa Liga, ou então, amazona e grega, e vinda de uma ilha em que homem nem pode pisar, Steve, eu acho que da fruta que você gosta a moça chupa até o caroço...

Não sei se esta é a primeira aparição do tal jato invisível, mas eu queria entender que diabo de idéia é essa? Afinal, qual a serventia de um avião invisível se você também não for invisível? Afinal, qualquer um poder ver você chegando. a única utilidade que me ocorre é estacionar em local proibido e não ser multado.

Mas, enfim, vamos à reunião. Lanterna Verde e Jonh Jones confirmados. E creio que não deve ser muito simples o Aquaman convencer os outros, afinal, quem daria crédito num cara que se diz amigo de um sujeito chamado "Peter, o baiacu"?

Vocês lembram aqueles episódios do Seinfeld em que o Kramer entrava, tirava um vidro de picles da geladeira, começava a comer e comentava: "Meu amigo, Bob Sacamano, estava num hospício e o eletro-choque não fez efeito por que a sinapses dele eram muito compridas!" Então, fico imaginando o Aquaman entrando, sentando na mesa, e mandando esta: "Meu amigo, Peter, o baiacu, disse que uma estrela-do-mar espacial gigante chegou na Terra e quer conquistar o planeta!" Será que o Flash responderia, "Arthur, não sei o que vocês no mar ficam fazendo pra matar o tempo, mas aqui na superfície estrelas-do-mar não vendem jornais..."

Bom, eis a reunião, com mesa, secretária, ata e informes:



Eis a primeira aparição da sede social campestre da Liga da Justiça da América, localizada numa caverna bucólica nos arredores de Metrópolis (pra vocês verem que o Superman não tem desculpa de não aparecer). Como podem ver, a sede dispõe de biblioteca, estacionamento para aviões invisíveis, laboratório, Lounge com TV de Plasma, tudo num misto de ambiente rústico com instalações de design futurista.

Bem, Aquaman dá o recado, e tiram-se os encaminhamentos:


Tem algo estranho aqui? Deixa eu explicar pra você, leitor, que não está inteirado da luta das minorias no ocidente. O que o Flash quis dizer foi o seguinte: "Eu e o Lanterna, machos, adultos e brancos, podemos cuidar sozinhos dos nossos afazeres. A garota e o E.T. com pinta de negão dividirão uma tarefa, por serem evidentemente menos eficientes." Ainda por cima, é de uma burrice sem par, pois olha o que ele manda o Aquaman fazer.



Ha, ótimo, mas será que ninguém aqui pensou no seguinte, que as tais estrelas-do-mar que Starro deu lá suas vitaminas, eram, de início, criaturinhas cândidas e amistosas dos oceanos, com as quais no Rei da Atlântida mantém as melhores relações de cortesia e favorecimentos? Será que num primeiro contato com elas, Aquaman não seria útil para tentar dialogar e dissuadí-las de cooperar com Starro? Ora, mas! Dialogar! Dissuadir! Quem já viu alguém pensar numa idéia dessas num gibi de super-heróis?

e é isso, por hora: o cenário está armado, os jogadores estão em campo, abrem-se as cortinas do maior espetáculo da Terra. No próximo post, prosseguiremos na análise deste fascinante épico de nosso tempo. Quais serão os planos de Starro? Onde estarão bebendo Superman e Batman? Com quem da Liga será que a Mulher Maravilha está chifrando Steve Trevor? E onde ela terá estacionado seu avião invisível, com aquela cabecinha avoada, a bonitinha?

10.9.07

essa eu encontrei num camelô no catete. não gosto muito destas edições da ebal em preto e branco, nem da fonte que usavam, que mais parecia que alguém tinha posto o gibi numa máquina de escrever. mas essa, pela ingenuidade do editor na década de trinta anos atrás, me pareceu imprescindível:


sabotagem? roubo? bandidagem? relaxa, superman, a gente estava quase pensando outra coisa...

quanto ao proprietário anterior do exemplar indigitado, cumpre salientar que foi ele que rasurou a palavra que superman propriamente confessava ser, e de um modo que eu não consigo mais identificar qual seja ela. que será que estava escrito? que mistérios ainda há de surgirem deste sarcófagos de ácaros? pra quem não tiver alergia, disponibilizo o volume para a inquirição pertinente.